terça-feira, 5 de março de 2013

MÃE (in memoriam)

Ela tinha 25 anos quando nasci...Lá se foram 63 anos de convivência...Para ela, eu era a mais boazinha, a mais quietinha...vivia querendo me poupar...ela me achava frágil...E isso irritava dois dos meus irmãos! Puro ciúme! Mamãe dizia: a 'Dinorá não sabe, não tem forças', na hora de empurrar a cadeira para o banheiro...E eles repondiam com grosseria: Tá na hora de aprender. A Dinorá parece a Penélope charmosa! E eu, evidentemente, ficava toda, toda!
Mas não estou aqui pra falar das nossas "briguinhas" de ciúme...como se ainda fôssemos crianças...
Estou aqui para homenageá-la...minha mãe.
Mulher forte, corajosa, ciumenta, atenta, dominadora, cuidadosa...mas não era dada a carinhos...Pra se conseguir um abraço, precisávamos envolver os seus braços em torno dos nossos...vinha um abraço suave...tímido...principalmente com o neto mais velho que quase a esmagava com um abraço apertado...não faz isso...assim você a machuca... ela já começava a ficar frágil, mas aguentava firme, com gritos de: 'me soltaaa!'
Ótima cozinheira, costureira...e os crochês, então nem se fala... Eu gostava de ouvir as histórias que ela contava da sua vida antes de vir do interior (Buri)para São Paulo... a alegria que sentia, ainda menina, ao ver os soldados do Exército que circulavam pela cidadezinha, na década de 30...ganhou de um deles uma bonequinha de pano. Isso causou uma euforia no grupo de crianças...E ela toda vaidosa: eu ganhei uma boneca do soldado...
Falava do grande amor lá do interior...que morreu solteiro depois da briga e da separação dos namorados e a dona Conce sofria mas não reatava o namoro. Briguinha tola: depois de ver o nome de outra pessoa nos pertences do jovem, ela desenhou um coraçãozinho e colocou o nome de outra pessoa...final de namoro...quantas histórias! Dos inúmeros namoros que teve...namorou vários estrangeiros e pracinhas fardados. Ah, aquelas fardas, quando veio morar em São Paulo! Ela gostava muito de contar as suas histórias. E que memória...
A última vez que conversamos, foi no dia 23 de fevereiro, no hospital. A partir dessa data, ela só foi piorando e eu não quis mais ir lá...não aguentava ver o seu sofrimento, mãe...muiiiitaa dor naquele joelho direito! Quanta dor! Disfarçávamos as lágrimas... 'me leva pra casa, Dinorá' , 'eu não posso, mãe!'.
E assim ela pedia pra todos os filhos: 'me leva pra casa!' Não podíamos! A infecção no joelho só podia ser tratada lá.
Até que ontem, as 5:35h da manhã maravilhosa de 4 de março, com a falência múltipla dos órgãos, aos 88 anos de idade, ela se foi... Tudo cessara...alívio e tristeza no meu coração...alívio pois ela não ia mais sofrer com aquele maldito joelho que rejeitara a prótese...Há 8 anos sofrendo: prótese, cirurgia, espaçador, prótese...casa, hospital. Ela queria voltar a viver a vida, cuidar da sua casa, o que quase a impedia por causa do andador. Mesmo debaixo de chuva, lá ia dona Conce cuidar das galinhas...Levava bronca e ela me dizia: você vê como eles falam comigo...Tristeza, porque não vou vê-la mais... 63 anos ao lado dessa mulher foi pouco...eu queria mais. E conforto porque agora ela descansa em paz..alegria pois sei que um dia nos encontraremos...
Morreu lúcida, reconhecendo a todos que dela se aproximou nos últimos instantes de vida. O seu semblante, mãe, reproduzia a beleza da mulher que a senhora foi na juventude. Vi uma foto sua com o pai ainda como namorados.
Descanse em paz, minha mãe. Deus a tenha num ótimo lugar...mas sem brigas com meu pai que já está lá, no alto, te esperando há 26 anos. E nos aguarde. Olhe aqui pra baixo, pois nós, daqui, estamos olhando pro alto pra te encontrar numa das estrelas...

Carpe diem




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